GAYS BUSCAM UNIãO ESTáVEL PARA GARANTIR SEUS DIREITOS
2010-02-23 18:23:45
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Contrato assegura ao companheiro o reconhecimento da relação entre pessoas do mesmo sexo e a posse dos bens adquiridos durante a convivência; em 2008 e 2009, sete cartórios da capital registraram 204 'casamentos'
Isis Brum
Marcelo e Luciano nunca puderam se casar, apesar de viverem juntos por cinco anos. No ano passado, Luciano morreu, vítima de aids, deixando direitos trabalhistas para serem recebidos. Sua família, que nunca aceitou seu relacionamento, entrou com uma ação na Justiça para requerer a indenização, alegando que ele era solteiro e não mantinha qualquer compromisso sério com Marcelo.
Os nomes são fictícios, mas a história, que se passa no interior do Estado, é verídica e recorrente, segundo as associações de defesa dos trans e homossexuais. O casal não tinha o contrato de união homoafetiva que assegura ao companheiro o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo e a posse dos bens adquiridos durante a convivência.
Esse pacto já foi formalizado por 204 casais de gays e lésbicas, em 2008 e 2009, em sete Cartórios de Notas da capital, que registraram essa contagem. A Associação da Parada do Orgulho GLBTde São Paulo ajudou a oficializar a união de mais 240 casais desde 2003.
Ideia
A união homoafetiva é um contrato semelhante ao de união estável feito por casais heterossexuais. Nesse documento público, assinado diante de testemunhas e registrado em cartório, os parceiros reconhecem a relação de convivência, definem o regime de partilha de bens (comunhão universal ou parcial ou separação total), a tutela dos filhos e nomeiam, se quiserem, o companheiro como seu procurador para administrar o patrimônio em caso de morte ou evento incapacitante (acidente ou doença).
“A ideia de se fazer esse pacto é comprovar a existência da união entre os homossexuais”, diz Maria Berenice Dias, advogada especializada em união homoafetiva e desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. “Em posse desse documento, o companheiro pode ser nomeado inventariante, requerer pensão junto à Previdência e o direito de colocar seu cônjuge como dependentes no plano de saúde.”
Na semana passada, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu o direito de casais homossexuais em união estável a receber os benefícios da previdência privada em caso de morte do parceiro. A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, afirmou que “a união afetiva entre pessoas do mesmo sexo não pode ser ignorada” e que, por mero preconceito, “sejam suprimidos direitos fundamentais das pessoas envolvidas”.
Provas
Segundo Berenice, os homossexuais estão desamparados juridicamente e documentos como o pacto de união homoafetiva tornam-se provas importantes para brigar por direitos ainda negados no âmbito do Direito de Família, Previdenciário, Cível e Tributário.
“Tudo o que puder ser feito no sentido de criar jurisprudência que regularize a união entre homossexuais, o cartório fará”, garante a tabeliã Priscila de Castro Teixeira Pinto Lopes Agpito, do 29º Tabelião de Notas. “Se a lei não veda, podemos fazer. Mas no caso da união homoafetiva, houve determinação expressa da nossa corregedoria para que todos os tabeliães lavrassem essas escrituras”, completa.
O 26º Tabelionato de Notas, na região central de São Paulo, foi o que mais realizou pactos de união estável entre casais gays e lésbicos. Foram 68 em 2008 e 67 no ano passado - um salto de 3.250% em comparação com as duas únicas escrituras lavradas no primeiro ano de registro, em 2002.
Enquanto a sociedade e o poder Judiciário avançam, no sentido de legalizar a união entre homossexuais, a legislação segue atrasada por preconceito, avalia Maria Berenice. Segundo ela, existem pelo menos 17 projetos de leis sobre o tema à espera de votação na Câmara desde 1995. “Tem uma que diz que homofobia é crime. Mas precisa de lei para ser crime? Não é óbvio?”, indaga.
VALOR JURÍDICO
A declaração de união estável pode ser feita em qualquer Cartório de Notas
Deve ficar expressa a convivência entre pessoas do mesmo sexo
Define-se o regime de partilha de bens: comunhão total ou parcial
Dá direito à posse imediata dos bens e de abertura de inventários
Pode-se requerer o direito à pensão no INSS e privada
Dá direito à dependência no plano de saúde do companheiro
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