domingo, 1 de agosto de 2010

Sociedade civil e a construção da esperança
Os desafios são muitos, a mortalidade por Aids é alta no País e no Ceará também, embora tenha sido significativamente reduzida a partir do acesso aos anti-retrovirais.

A pandemia de Aids nos trouxe a possibilidade de resignificarmos a solidariedade, que se construiu em longos e difíceis anos. Esta solidariedade, imprescindivelmente, reúne elementos complexos, como a desconstrução de estigmas (quanto às sexualidades, às questões de gênero, orientação sexual, pobreza, etnias etc.), e, especialmente, no que diz respeito aos múltiplos olhares sobre as pessoas que vivem com HIV/Aids e as conexões entre conceitos como saúde e doença, vida e morte, cidadania, entre outros.

E tem sido assim nesses últimos 25 anos, com momentos de intensas lutas sociais. No início dos anos 1980, organizações de defesa dos direitos de homossexuais, e alguns profissionais de saúde, empreendiam as primeiras respostas à epidemia no Brasil. Ao mesmo tempo em que realizavam ações educativas, exigiam dos governos medidas para prevenir novos casos e tratar as pessoas que já estavam doentes.

As conquistas e os desafios movem nossa esperança, alguns são marcos históricos, que não podem ser esquecidos. O controle da qualidade do sangue, o fornecimento universal dos medicamentos anti-retrovirais, via SUS, a definição de procedimentos quanto à prevenção da transmissão perinatal (que pode reduzir a cerca de 1% as chances de transmissão da mãe HIV+ para seu bebê), são algumas das grandes conquistas que movimento social, pesquisadores, profissionais de saúde e governos impingiram à resposta à Aids no País.

Os desafios são muitos, a mortalidade por Aids é alta no País e no Ceará também, embora tenha sido significativamente reduzida a partir do acesso aos anti-retrovirais. O sistema público de saúde tem deficiências que limitam a assistência às pessoas vivendo com HIV/Aids, número insuficiente de leitos hospitalares, acesso irregular aos medicamentos para efeitos colaterais e infecções oportunistas. Enfim, a percepção da vulnerabilidade em HIV/Aids, que entrecruza fatores como acesso à saúde pública, auto-estima, condições de vida (moradia, alimentação, emprego/renda etc.), opressões sexuais, impõe a importância de políticas sociais integradas no campo das DST/HIV/Aids.

Desafio crucial é a necessidade do governo federal licenciar compulsoriamente alguns medicamentos anti-retrovirais (cujas patentes são propriedade de grandes laboratórios transnacionais), com respaldo em lei brasileira e tratados internacionais, que afirmam o interesse da saúde pública em detrimento dos enormes lucros da indústria farmacêutica. Sem isso, o programa brasileiro de Aids (que é referência para o mundo) não tem sustentabilidade, devido aos altos custos de importação de alguns dos medicamentos.

A participação das organizações da sociedade civil (mais de 600 no país), do movimento social de luta contra a Aids, é singular para as políticas públicas em DST/HIV/Aids, e tem apontado o caminho da esperança e da solidariedade, incluindo-se aí a perspectiva histórica do descobrimento de vacinas que contribuam para por fim à pandemia de Aids.


Francisco Pedrosa é jornalista , mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE) e ativista do movimento homossexual, do GRAB, e da luta contra a Aids.

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